A pejotização é um fenômeno crescente nas relações de trabalho no Brasil. Com o objetivo de reduzir encargos trabalhistas, muitas empresas contratam profissionais como pessoas jurídicas (PJs), como alternativa à formalização de vínculos por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Embora essa prática seja, de fato, vantajosa para o empregador e também para o próprio trabalhador, ela possui alguns riscos jurídicos.
O que torna o profundo entendimento da pejotização algo fundamental para que advogados trabalhistas possam atuar com segurança na defesa dos direitos dos clientes. Seja na condição de reclamante ou de reclamado.
Por isso, neste artigo, vamos analisar o que é a pejotização; como ela se manifesta nas relações de trabalho; como o advogado pode agir para descaracterizá-la; além de estabelecer a diferença entre ela e a terceirização.
E, como de costume, no final, trazemos um modelo de petição inicial de reclamatória trabalhista, no que diz respeito à pejotização.
O que é pejotização
É chamada de pejotização a prática de contratar um trabalhador por meio de um contrato de prestação de serviços, com CNPJ, ao invés de firmar um vínculo empregatício com base na CLT.
Essa contratação geralmente ocorre por meio de um contrato de prestação de serviços entre a empresa e a pessoa jurídica individual, criada pelo próprio trabalhador.
Em teoria, trata-se de uma relação entre empresas. Porém, na prática, muitas vezes o profissional continua exercendo atividades típicas de um empregado.
Ou seja, ele cumpre horário, está subordinado a chefias, recebe ordens e depende economicamente do contratante – características que evidenciam os elementos clássicos da relação de emprego: pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade.
O Artigo 3º da CLT define o empregado como:
Art. 3º. “Toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.
Assim, a pejotização é, muitas vezes, utilizada como forma de mascarar o vínculo empregatício, com o objetivo de evitar encargos trabalhistas e previdenciários. Conduta que, quando comprovada, pode ser revertida judicialmente.
Pejotização nas relações de trabalho
A pejotização não é algo novo. No entanto, ela se intensificou após a Reforma Trabalhista de 2017, com o estímulo à terceirização e à flexibilização das relações laborais (logo mais veremos a diferença entre pejotização e terceirização).
Áreas como tecnologia, comunicação, saúde e consultoria têm tido grande foco na pejotização.
Profissionais como desenvolvedores, jornalistas, médicos e engenheiros têm se tornado “PJ” como alternativa de manter suas atividades nas empresas em que atuam.
Do ponto de vista jurídico, o problema é que, não raro, a real autonomia do trabalhador inexiste: ele presta serviços de forma exclusiva para a empresa, segue regras internas e está sujeito a controle de jornada, inclusive com ferramentas digitais de monitoramento.
Assim, a jurisprudência tem reafirmado que, mesmo com contrato civil assinado, é a realidade que determina a natureza da relação. Ou seja, a terceirização é válida desde que não haja pessoalidade e subordinação direta.
Como descaracterizar a pejotização
Para o advogado que atua na defesa do trabalhador, o principal desafio é reunir provas que demonstrem que a relação era, na verdade, de emprego.
O primeiro passo é analisar se estão presentes os quatro elementos essenciais da relação de emprego:
- Pessoalidade: o serviço só poderia ser prestado pelo próprio trabalhador;
- Onerosidade: havia pagamento regular pelos serviços;
- Habitualidade: a prestação de serviços era contínua, e não eventual;
- Subordinação: o trabalhador estava sujeito a ordens e controle da empresa.
Se esses elementos forem identificados, o advogado deve buscar provas documentais e testemunhais, como por exemplo:
- E-mails com ordens diretas de superiores;
- Controle de ponto ou registros de acesso;
- Provas de exclusividade;
- Depoimentos de colegas;
- Prints de mensagens, convocações de reunião, entre outros.
O Artigo 9º da CLT estabelece que:
Art. 9º. “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.
Na defesa do reclamante, o advogado deve construir a narrativa com base na realidade dos fatos. Já na defesa da empresa, o foco é demonstrar a autonomia e a ausência de subordinação.
Diferença entre terceirização e pejotização
A terceirização ocorre quando uma empresa contrata outra para realizar determinada atividade, com seus próprios funcionários, sem subordinação direta aos gestores da empresa contratante.
A pejotização, por outro lado, é a contratação de um indivíduo travestido de empresa. A empresa “exige” que o trabalhador abra um CNPJ para firmar um contrato de prestação de serviços, quando, na realidade, ele atua como empregado.
Na terceirização, o trabalhador tem vínculo com a prestadora de serviço. Na pejotização, o vínculo se dá sob um contrato entre CNPJs, mas os elementos da relação de emprego estão presentes.
Crescimento da pejotização com a Reforma Trabalhista
A Lei Nº 13.467/2017, também chamada de Reforma Trabalhista, ampliou a possibilidade de terceirização, inclusive na atividade-fim da empresa. O que, como já mencionado, gerou um aumento significativo da pejotização no Brasil.
Com menos restrições legais, muitas empresas passaram a optar por contratações via pessoa jurídica, com o objetivo de flexibilizar e modernizar as relações de trabalho.
Porém, a prática se expandiu também para funções tipicamente empregatícias. Muitos trabalhadores foram demitidos e recontratados como PJs, sem alteração real de suas atribuições ou rotina.
O que tem levado a Justiça do Trabalho, em decisões recentes, a reforçar que a Reforma Trabalhista não autoriza fraudes na relação de emprego.
O próprio Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a ADPF 324, permitiu a terceirização da atividade-fim. O que, contudo, é diferente de chancelar a pejotização fraudulenta.
Modelo reclamação trabalhista pejotização
Como prometido, e de costume, a seguir, apresentamos um modelo de petição inicial a ser utilizado como base em ações trabalhistas voltadas ao reconhecimento de vínculo de emprego em situações de pejotização. Confira:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DO TRABALHO DA ___ VARA DO TRABALHO DE [CIDADE/UF]
[NOME COMPLETO DO RECLAMANTE], nacionalidade, estado civil, profissão, portador do CPF nº [] e do RG nº [], residente e domiciliado à [endereço completo], por seu advogado (instrumento de mandato anexo), com escritório profissional na [endereço do advogado], onde recebe notificações e intimações, vem, respeitosamente, propor a presente:
RECLAMAÇÃO TRABALHISTA
com fundamento nos artigos 818 da CLT e 373, I, do CPC, em face de:
[NOME DA EMPRESA RECLAMADA], pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº [___], com sede na [endereço completo], pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:
1. DOS FATOS
O Reclamante foi contratado em [data] pela Reclamada para prestar serviços como [função], por meio de sua pessoa jurídica, [nome da empresa do reclamante], inscrita no CNPJ sob o nº [___].
Apesar da formalização contratual entre empresas, a realidade da relação era de vínculo empregatício, uma vez que estavam presentes os requisitos do art. 3º da CLT:
- Pessoalidade: o serviço era prestado exclusivamente pelo Reclamante;
- Habitualidade: a prestação era contínua, de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h;
- Subordinação: o Reclamante seguia ordens diretas de superiores, cumpria metas e rotinas internas;
- Onerosidade: recebia pagamento fixo mensal, sem variações.
2. DO DIREITO
Nos termos do art. 9º da CLT, são nulos os atos que visem a desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na legislação trabalhista.
Além disso, o princípio da primazia da realidade determina que a verdade dos fatos prevalece sobre a forma, conforme entendimento pacífico da jurisprudência trabalhista.
A contratação via pessoa jurídica foi apenas uma formalidade para mascarar a relação de emprego, devendo ser reconhecido o vínculo empregatício entre as partes.
3. DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer:
a) O reconhecimento do vínculo de emprego entre o Reclamante e a Reclamada, com início em [data] e término em [data/“até o presente momento”];
b) Anotação da CTPS com a função de [cargo], salário de R$ [valor];
c) Pagamento de verbas rescisórias correspondentes (aviso prévio, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%, saldo de salário, etc.);
d) Multa do art. 477 da CLT;
e) Indenização substitutiva do seguro-desemprego;
f) Honorários advocatícios (art. 791-A da CLT);
g) Juros, correção monetária e demais cominações legais.
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos.
Dá-se à causa o valor de R$ [valor].
Termos em que, Pede deferimento.
[Local], [data].
[Assinatura do advogado] [Nome completo] OAB/[UF] [número]
Gostou do modelo?
Existem milhares de outros tipos de documentos como esse disponíveis aos assinantes Jusfy, em JusFile.
JusFile é um banco quase infinito de documentos úteis a todo advogado em seu dia a dia. Todos confeccionados por um time qualificado de profissionais e, em 90% dos casos, testados e aprovados em juízo.
Assine Jusfy e tenha milhares de documentos distintos para adaptar à sua necessidade, ganhando tempo e aumentando a eficiência do seu escritório.